Der Spiegel
Por Marco Evers
O déficit orçamentário da Grécia é absurdamente alto. Mas o do Reino Unido é ainda maior. O primeiro-ministro Gordon Brown terá uma tarefa bem definida neste ano eleitoral – e os cortes orçamentários que estão por vir serão dolorosos.
No momento mais difícil da luta contra Adolf Hitler, o Ministério da Informação britânico – que existiu durante a Segunda Guerra Mundial – encomendou um pôster especial. Com o objetivo de promover a calma no cenário interno, ele mostrava a coroa do rei George VI contra um fundo vermelho, com as palavras “Mantenham a Calma e Sigam em Frente” impressas abaixo da imagem.
A situação jamais se tornou suficientemente desesperadora para justificar o uso do pôster, e os milhões de cópias impressas foram arquivados sem nunca terem sido utilizados. Dez anos atrás, um vendedor de livros descobriu uma única cópia e a pendurou na parede da sua loja. Isso poderia muito bem ter sido o fim da história do pôster, mas o país deparou-se subitamente com crises múltiplas: ataques terroristas, uma crise no setor bancário e, finalmente, a crise econômica e de crédito.
O pôster de um vermelho vivo está atualmente dependurado nas paredes dos gabinetes de vários diretores e membros do parlamento, em quarteis militares e dormitórios de estudantes. Ministérios inteiros o estão utilizando para estimular a moral, e versões emolduradas do pôster estariam até adornando as paredes de 10 Downing Street (residência e gabinete do primeiro-ministro do Reino Unido) e do Palácio de Buckingham.
Só que desta vez não está sendo fácil manter a calma e seguir em frente. A libra esterlina anda mal das pernas. A economia está mergulhada na pior crise desde 1931, e o país por muito pouco não despencou em uma recessão profunda. Os especuladores estão apostando que não haverá uma recuperação econômica. A instabilidade no setor financeiro tem provocado um impacto mais severo nas finanças do governo do Reino Unido do que nas de outros países industrializados. O déficit orçamentário de Londres chegará a 186 bilhões de libras esterlinas (205 bilhões de euros, US$ 280 bilhões, R$ 494,5 bilhões) neste ano – o que representa 12,9% do produto interno bruto do país.
Ninguém sabe como resolver o problema
Este país, que já foi chamado de “Cool Britannia” (termo usado de meados até o final da década de noventa para descrever a cultura moderna do Reino Unido), está imerso em uma série crise, com um rombo no orçamento ainda maior do que o déficit orçamentário da Grécia, que atualmente é de 12,2%. E ninguém sabe como resolver o problema.
De fato, esse problema tornou-se tão preocupante que a Comissão Europeia disse na quarta-feira (17/03) a Londres que se empenhasse mais em enxugar o seu orçamento, segundo uma cópia de um relatório que foi vazado para a agência de notícias “Reuters” no início desta semana. “A estratégia fiscal delineada no programa de convergência do Reino Unido não prevê a correção do déficit excessivo até o ano fiscal de 2014/2015, conforme recomendado pelo conselho”, afirmou a Comissão Europeia na sua declaração.
Para tornar as coisas ainda mais complicadas, os britânicos irão às urnas daqui a algumas semanas, provavelmente em 6 de maio. O próximo primeiro-ministro terá uma tarefa definida pela frente: reduzir o déficit orçamentário maciço, reestruturar a indústria bancária e reorientar eficientemente a economia. E ele terá que fazer isso tudo com um orçamento limitado.
Ambos os candidatos darão aos eleitores motivos para que estes questionem as suas qualificações para implementar as medidas que se fazem necessárias. O atual primeiro-ministro, Gordon Brown, 59, quando ocupava o seu antigo cargo de chancellor of the exchequer (cargo equivalente ao do Ministro da Fazenda brasileiro) no governo do seu predecessor, Tony Blair, gabava-se de ter acabado para sempre com as oscilações da economia. Entretanto, mal ele recebeu o cargo de Blair e a economia do país despencou.
Brown foi ridicularizado na imprensa, enfrentou revoltas no seu partido e o desprezo da população. Mas ele foi persistente. O primeiro-ministro engoliu as críticas e gradualmente construiu a reputação de um gerente de crise capaz, pelo menos durante a crise econômica global. Pesquisas realizadas nos últimos anos demonstram que, embora poucos britânicos o apreciem, uma quantidade cada vez maior de eleitores está disposta a votar nele mesmo assim.
Impostos e taxas mais elevados
Parte da imagem robusta de Brown deve-se primariamente ao seu adversário conservador, David Cameron, 43, que faz parte da arrogante classe alta, e cuja atuação como assessor especial do chancellor of the exchequer, durante a queda da libra esterlina em 1992, é considerada a sua única experiência em lidar com dificuldades econômicas. Além do mais, os seus colegas de partido questionam as qualificações de George Osborne, 38, o chancellor of the exchequer designado por Cameron.
O Reino Unido tem pela frente tempos difíceis. Tão difíceis, de fato, que nenhum dos partidos ousou dizer em voz alta aquilo que muitos dos seus membros já sabem. No mínimo, os britânicos podem esperar aumentos de impostos e taxas. “Teremos que fazer muitos sacrifícios”, avisa o economista Carl Emmerson, do independente Instituto para Estudos Fiscais, em Londres. “Os cortes no orçamento serão mais drásticos do que aqueles implementados no governo da ex-primeira-ministra Margaret Thatcher”.
Mais drásticos do que os de Thatcher. Estas palavras ainda hoje provocam um instinto de fuga – fuga para longe dos conservadores. Na década de oitenta, foram montadas nas ruas barricadas em chamas, e a polícia entrou em confronto com manifestantes. Foi uma época que os britânicos não esqueceram.
Leia mais: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/derspiegel/2010/03/18/reino-unido-vive-a-sua-propria-tragedia-grega-e-tera-que-fazer-cortes-orcamentarios.jhtm
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