quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Lula x FHC: Saneamento Basico - O Problema da Simplificacao dos Numeros

Neste periodo eleitoral, que promete uma polarizacao na disputa pela Presidencia da Republica, nada mais normal do que a comparacao de dados entre os governos que se sucederam, principalmente por representarem correntes politicas diversas. O tema agora e saneamento basico. Assim como na questao dos numeros do ensino basico, devemos tomar cuidado com a analise superficial de comparacoes diretas entre periodos de governos. Outras variaveis devem ser levadas em conta para que se possa montar um quadro completo ou mais proximo da realidade sobre o desempenho em determinadas areas. Neste caso do saneamento basico, o texto do Prof. Leo Heller, da UFMG, publicado no blog do Nassif, traz importantes consideracoes sobre o tema, levando em conta variaveis como a qualidade da agua consumida, a descontinuidade no abastecimento, a tecnologia apropriada para cada assentamento humano, a coleta de residuos solidos pelos municipios, o periodo de maturacao dos investimentos federais, entre outros aspectos. Demonstra que a comparacao direta de numeros descontextualizada e limitada por nao levar em conta o aspecto qualitativo do suprimento das demandas da sociedade.

Do blog do Nassif
Avanços no saneamento básico: as armadilhas dos números
Léo Heller (*)


Tem recebido recente repercussão na imprensa o estudo comparativo entre os períodos governamentais Fernando Henrique Cardoso e Lula, com base em indicadores da PNAD, de autoria do Prof. Claudio Salm, da UFRJ. A conclusão geral do estudo é pela equivalência do avanço de indicadores sociais, quando se comparam ambos os períodos. Trato aqui de trazer ao debate alguns elementos relacionados aos indicadores de saneamento básico. Em síntese, argumento que tal tipo de análise necessita ser cuidadosa, em dois sentidos: os números requerem leitura menos linear e simplista e é fundamental agregar, à análise quantitativa, uma avaliação qualitativa das políticas praticadas. Embora reduzido o espaço disponível nesta seção, tento sintetizar alguns desses aspectos, com base nas matérias publicadas.

O indicador relativo ao abastecimento de água revela que, em 1996, 48,5% da população pobre tinham acesso à rede geral e este número se eleva para 59,6% em 2002 e 68,3% em 2008. Ou seja, tem-se elevação de 11 pontos percentuais no primeiro período, representando o governo FHC, e de 9 no segundo, representando o período Lula. Os números, em uma primeira análise, sugerem desempenhos equivalentes. Contudo, na cobertura por redes de saneamento, avançar sobre percentuais mais baixos é mais fácil do que quando estes se aproximam da universalização do atendimento, pois são justamente os locais com urbanização mais precária, como vilas e favelas, os mais refratários e complexos para o recebimento dos benefícios. Por outro lado, avaliar o desempenho do abastecimento de água com base apenas na conexão à rede fornece uma pálida imagem da forma como ocorre o atendimento, pois oculta as imprescindíveis informações sobre a qualidade da água consumida e a ocorrência de descontinuidades no abastecimento.

Os dados divulgados sobre o atendimento pela coleta de esgotos para a população pobre mostram avanço de 9 pontos percentuais e 11 pontos, para o primeiro e o segundo períodos respectivamente, atingindo 52,4% de cobertura em 2008. Mostra, igualmente, aparente desempenho e aqui cabe o mesmo comentário anterior (elevar de 41 para 52% constitui façanha maior do que elevar de 32 para 41%). Além disso, a análise apenas deste dado pressupõe que a solução de redes coletoras é a única ou a melhor, desconhecendo importante debate sobre a tecnologia mais apropriada para cada tipo de assentamento humano. E, por fim, ignora a existência de outras unidades do sistema de esgotamento sanitário, como a disposição final, uma das maiores dívidas ambientais do setor de saneamento. Dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico – PNSB, de 2000, mostram que apenas 14% das localidades brasileiras tinham algum tipo de tratamento de esgotos, resultando no lançamento de 2/3 do volume de esgotos coletados nos cursos de água, sem qualquer tipo de tratamento.
(...)

(*) LÉO HELLER é professor do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pesquisador no tema das políticas públicas de saneamento.

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